Por mais high-tech que seja, um wearable também precisa ser fashion

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E se o Apple Watch ganhasse versões de grife? Essa foi a simulação que o designer David Lo fez dos relógios imaginados pelos códigos da Chanel, Alexander Wang, Louis Vuitton e Maison Martin Margiela.

Em setembro passado, em plena semana de moda de Nova York, um lançamento fashion de impacto aconteceu na Califórnia, mais especificamente na cidade de Cupertino. No dia 09.09, no horário entre os desfiles da Rodarte e da Marc by Marc Jacobs na outra costa, a Apple apresentou o Apple Watch, aposta de acessório de vestir inteligente da gigante. Em Paris, também durante a semana de moda, Azzedine Alaïa, famoso por sua reclusão do fervo fashionista, recebeu a nata de jornalistas e editores que rodavam entre os desfiles junto com alguns tantos itens do novo “iRelógio” em seu endereço; na manhã anterior, Karl Lagerfeld se atrasou para o desfile da Chanel para conhecer a novidade na multimarcas Colette. Semanas depois, o relógio ganhava seu début fashionista na capa da Vogue China, no pulso da modelo Liu Wen complementando o look Céline. E outra: Paul Deneve, ex-CEO da Saint Laurent, é, desde 2013, o vice-presidente de projetos especiais da Apple.

Não é só por luxo que a turma da tecnologia cerca a da moda. A iniciativa de fazer um acessório inteligente que dê conta de sincronizar os diferentes inputs eletrônicos que fazem parte de nossa rotina precisa levar o estilo em conta. Depois da democratização online da moda, é difícil impulsionar algo que iremos vestir sem passar por quem pensa (ou dita) o que é novo, o que combina com o que. A missão dos relógios, óculos (lembra do Google Glass na passarela de Diane Von Furstenberg dois anos atrás?), chapéus ou roupas que querem aproximar os sinais GSM, WiFi ou Bluetooth mais ainda de nossos corpos não deslancha de verdade se não ganhar aval do mercado de moda. Não um adianta um wearable vibrar notificações, atender ligações ou compartilhar batimentos cardíacos se ele for feio.

Na último 19.11, a Intel lançou uma tentativa de aproximação direta. Convocou uma dupla que sabe fazer o que é cool e conectar o que tem cara de novidade com o seu séquito: Humberto Leon e Carol Lim, da multimarcas/grife Opening Ceremony (responsáveis também pelo revival de sucesso da Kenzo). Depois de 18 meses de trabalho, nasceu o MICA, numa categoria de “smartbijoux”. Na verdade, um maxibracelete (trend alert!) de couro de cobra que ganha diferentes pedras em suas versões e uma tela de safira curva onde as funcionalidades aparecem. Ele é grande, como dá pra perceber no curta-metragem estrelado por Rashida Jones para divulgação, mas é tão bonito quanto as modernidades de sucesso da dupla. Tem mais dois pontos a favor: não depende de celulares e foi pensado (originalmente) para as mulheres; o lançamento aconteceu com festinha (e hashtag), como se solta uma nova coleção. O MICA ganhou as funções básicas de um smartalgumacoisa: agenda, sync com produtos Google e com o Facebook, navegação GPS (da TomTom), aqui integrada com o Yelp! (site-guia de estabelecimentos muito usado lá fora), e bateria duradoura; de bônus, já ganhou um editorial no site da multimarcas. Sai no início de dezembro a tempo das compras de Natal por US$ 495, mas só nos Estados Unidos por enquanto.

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As duas versões da pulseira MICA, feita pela Intel com a Opening Ceremony

Outra novidade anunciada nesta terça-feira (25) também soa promissora para o caminho dos “fashionables”. Will.i.am, produtor musical e empresário geek, convocou André Leon Talley (discípulo de Diana Vreeland e ex-Vogue US, veja bem) como diretor de moda e estilo da empresa dedicada ao lançamento do i.am Puls, o seu bracelete inteligente. No design, ele é parecido com o MICA e não tem o formato de relógio, mas sim de pulseira larga e grossa, só que (ainda) sem decorativismo. Com sistema operacional próprio compatível com Android, ele ganha nas funções: também autônomo, administra agenda, contatos e e-mail, mas ganha funções de telefone mais redes sociais (Facebook, Instagram e Twitter), player de música (claro) e uma busca centralizada de inteligência (e diálogo) tipo Siri (Willi?). Falta o aspecto fashionista, que deve ganhar com a inusitada adição ao time.

Aqui no Brasil, a Sony estendeu o seu braço à moda em setembro ao convocar o joalheiro Jack Vartanian para uma edição especial de sua SmartBand, pulseira de design originalmente esportivo que funciona com celulares. Sob mãos talentosas, a borracha foi trocada pelo couro em quatro opções de cores (vendidas juntas) e a unidade principal do dispositivo foi gradeada em prata ou ouro; esta última opção, a versão mais exclusiva de apenas dez unidades, é finalizada com quatro diamantes laterais. Têm status (e preço) de joia (R$ 3.800 a de prata, R$ 9.500 a de ouro) e são acompanhadas por um modelo do smartphone ao serem vendidas na flagship de Vartanian e em seu e-commerce. É do celular que saem os alertas vibratórios e para onde vão os registros de calorias, passadas ou horas de sono captados, além do alerta “esqueci o celular” emitido ao ser afastado por mais de dez metros da “smartjoia”.

É claro que o design sempre foi uma prioridade das gigantes da informática em seus itens próprios. No caso dos relógios, o caminho tem sido aprimorar suas linhas e proporções, refiná-los para chegar mais perto dos modelos tradicionais ou aumentar a variedade de seus elementos e torná-los personalizáveis (materiais do corpo, pulseiras). Só que a comunhão com a moda pode virar um atalho poderoso para chegar a quem não é tão próximo da tecnologia e atingir consumidores que não estão dispostos (ou dispostas!) a incluir algo esteticamente não tão desejável no look só por causa de suas funcionalidades — voltando ao Apple Watch, quem acompanha lançamentos de relojoaria dificilmente foi seduzido pelo quadrado no pulso de Tim Cook. E mais, muita gente acha que não precisa de um wearable. Vale botar pra funcionar então uma engrenagem fashion que roda muito bem: transformar algo quase supérfluo, de preço salgado e com todas as qualidades de luxo em um objeto de desejo imbatível, que atinge até quem não gosta de admitir que circula por essas bandas. A moda pode transformar os acessórios inteligentes em “item tem-que-ter”, mas tem que ser bonito. A hora é essa.

Update 26.11: deixei passar mais uma iniciativa que une diretamente os smartwatches com a moda, divulgada no dia anterior ao texto. Michael Bastian, famoso por sua moda masculina contemporânea, uniu-se à HP (em um encontro intermediado pelo bombado site Gilt) para um modelo de relógio inteligente de design bem superior aos similares, ainda que com menos funcionalidades. A história completa dele está no A Blog To Watch e vem alinhada com a conversa aí de cima: “pode parecer óbvio para amantes de relógios que uma peça precisa ser bonita, mas digo que isso era (ou ainda é) novidade para muitos engenheiros”, diz o texto que introduz o modelo.

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À direita, Will.i.am com o seu i.am Puls e, à esquerda, dois modelos da SmartBand, da Sony, redesenhada pelo joalheiro Jack Vartanian

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