O encontro entre a moda e a arte é pauta que voltou a ganhar atenção especial nas últimas temporadas, culpe a galeria de arte da Chanel. A conversa entre uma e outra é gostosa de acompanhar nas diferentes frentes: apropriação do trabalho de artistas pelas grifes, o universo elitista dos dois mundos em comunhão para aumentar ainda mais o passe das roupas ou a combinação dos processos criativos das duas áreas (caso notável: Raf Simons e Sterling Ruby). Degraus acima, há outra discussão recente que vale a pena: quando a turma da moda viu a abertura online que a internet proporcionou e teve que encostar cotovelos na primeira fila com gente que acabava de chegar, o caminho foi correr para a próxima empreitada que tivesse o círculo social e profissional ainda mais restrito. Nomes da indústria e celebridades correram então para as colinas da arte contemporânea. Quando todo mundo quis ser fashion, acompanhar só moda deixou de ser legal. A bola da vez é ser artsy (ou “arte é a nova moda”, piada que solto por aí faz tempo).
Tem casos (muito legais) e casos (oportunistas). O mais recente apareceu nas páginas da edição de inverno 2014 da V Magazine (título que une os dois temas há tempos). A revista fez uma seleção de 14 looks de designers mais recentes que chegariam às araras do Dove Street Market, empacotou e mandou para o endereço de Ai Weiwei (timing perfeito já que é ele o tema deste mês por aqui, olha que coisaboa!). Ele ganhou passe livre, poderia fazer o que quisesse com as peças para uma matéria da publicação. Ai olhou para, coincidentemente, as 14 latas de tinta que tinha no estúdio, tons usados para sua série “Colored Vases”, e soube o que fazer. Ligou para contatos próximos (ao invés de telefonar para uma agência de modelos), vestiu seus personagens e deu um banho de cor em cada uma das produções enquanto fotografava o processo e o resultado final.
É muito divertido ver que alguém pegou essas roupas caras e tomou uma liberdade que muita gente queria, mas tem mais aqui. Por exemplo: o logo da Hood By Air não foi mais o mesmo depois de enfrentar uma camada colorida; as referências multiculturais das peças da Koton to Zai também não. As cores vibrantes encobrem, física e conceitualmente, as noções de grife e de referências, injetando o novo elemento assimilado de forma universal e instantânea. Fica colorido, mas também fica unidimensional, tipo um “balde de tinta fria” por cima das complexidades e nuances de cada trabalho. É bem-humorado — o “look do dia de muderno que podia ir pro insta pra ganhar like” ganha um belo deboche artístico —, mas é também provocador; os jatos de tinta são, por exemplo, uma das maneiras utilizada por ativistas para protestar contra o uso de peles (lembra quando a Samantha do “Sex and the City” vai a um desfile?).
Assim, além do material, Ai Weiwei leva os aspectos de sua obra fora da moda para a nova incursão fashionista. Depois da publicação, a interação virou exposição na Dover Street Market de Nova York, com as novas versões das roupas no mesmo ambiente das araras com os itens originais. Comprar uma delas vira outra experiência; a pauta foi transformada em arte, mas também em campanha publicitária. Do jeito que a moda gosta.