Em Ford vs. Ferrari, o rugido da ambição e o preço da glória no asfalto
No filme “Ford vs. Ferrari”, lançado em 2019, James Mangold não nos oferece um mero filme de corrida. Ele orquestra uma sinfonia de motores, ambição e sacrifício, um balé mecânico onde a busca pela vitória se entrelaça com a complexidade das relações humanas, nos convida a contemplar o preço da glória e a efemeridade do sucesso no turbilhão da competição, baseado em uma história real.
A produção é atração neste sábado do Supercine, na TV Globo, na madrugada de sábado (15/3) para domingo, a partir das 0h50. Em streaming, vocë pode assistir ao filme completo no catálogo do Disney Plus.
A década de 1960, palco da rivalidade épica entre Ford e Ferrari, é mais do que um pano de fundo; é um personagem em si.
Uma era de otimismo tecnológico e audácia, onde a velocidade era a metáfora perfeita para o progresso. Henry Ford II, interpretado por Tracy Letts com uma ferocidade contida, não busca apenas vencer uma corrida; ele busca afirmar a supremacia americana, vingar um insulto, inscrever seu nome na história. A recusa de Enzo Ferrari (Remo Girone, imponente em sua breve aparição) em vender sua empresa é o estopim de uma obsessão que consumirá recursos, carreiras e vidas.
Mas a verdadeira alma do filme reside na improvável parceria entre Carroll Shelby (Matt Damon) e Ken Miles (Christian Bale). Shelby, o ex-piloto transformado em engenheiro, carrega o peso de um sonho interrompido e a astúcia de um estrategista. Damon, com sua presença magnética, equilibra a determinação de Shelby com um toque de melancolia. Miles, por sua vez, é a força indomável da natureza, um gênio da mecânica com um temperamento explosivo e uma aversão visceral à autoridade. Bale, em mais uma de suas transformações camaleônicas, entrega uma performance visceral, capturando a paixão obsessiva, a teimosia e a vulnerabilidade de um homem que vive para a velocidade.
A dinâmica entre Shelby e Miles é o motor que impulsiona a narrativa. É uma dança tensa entre a razão e a paixão, a estratégia e a intuição, o pragmatismo e a genialidade. Eles são como dois polos opostos de um ímã, atraídos e repelidos pela mesma força: o desejo insaciável de vencer. Sua luta contra a burocracia corporativa da Ford, personificada pelo executivo Leo Beebe (Josh Lucas, em um papel deliberadamente antipático), ecoa a batalha de qualquer artista contra as forças que tentam domesticar sua criatividade.
Mangold, auxiliado pela fotografia vibrante de Phedon Papamichael (“Um Completo Desconhecido” e “Indiana Jones e a Relíquia do Destino”) e pela montagem precisa de Michael McCusker e Andrew Buckland (vencedores do Oscar), transforma as corridas em espetáculos viscerais.
Somos colocados dentro do cockpit, sentindo a vibração do motor, o cheiro de óleo queimado, a força G esmagando o corpo. Mas o verdadeiro drama não está apenas na velocidade, mas nas entrelinhas: nos olhares trocados entre Shelby e Miles, nas discussões acaloradas, nos momentos de silêncio que revelam a profundidade de sua conexão.
“Ford vs. Ferrari” não é sobre carros; é sobre os homens da tela, que visam desafiar seus limites, que se entregam a uma paixão, que buscam a imortalidade em um mundo efêmero. O filme nos lembra que a vitória, por mais gloriosa que seja, pode ter um sabor amargo. O rugido dos motores, a euforia da multidão, os aplausos… tudo isso se dissipa, deixando para trás apenas o eco de um sonho realizado, e as cicatrizes daqueles que se sacrificaram para alcançá-lo.
Leia também…
Velozes e Furiosos 8 foi sucesso bilionário marcado por treta de atores, relembre curiosidades

A atuação de Caitriona Balfe como Mollie Miles, embora coadjuvante, é essencial para humanizar a narrativa. Ela representa o outro lado da moeda, o sacrifício silencioso das famílias que suportam a ausência, o medo e a incerteza em nome da paixão de seus entes queridos.
Em sua essência, “Ford vs. Ferrari” é um filme sobre o que significa ser humano: a nossa capacidade de sonhar, de lutar, de amar e de perder. É um lembrete de que a jornada, muitas vezes, é mais importante do que o destino.
Em “Ford vs. Ferrari”, a verdadeira vitória não está na linha de chegada, mas na camaradagem forjada na fornalha da competição, e no legado indelével deixado para trás. Um lembrete que a busca incessante de nossos sonhos molda quem realmente somos.
Quem é quem no elenco de Ford vs. Ferrari
- Matt Damon como Carroll Shelby: Ex-piloto campeão, engenheiro e empresário, lidera o projeto Ford GT40. Estrategista e determinado.
- Christian Bale como Ken Miles: Piloto britânico talentoso e temperamental, gênio da mecânica. Essencial para o desenvolvimento do GT40, mas difícil de lidar.
- Tracy Letts como Henry Ford II: Presidente da Ford, impulsionado pela ambição e desejo de vingança contra a Ferrari.
- Josh Lucas como Leo Beebe: Executivo da Ford, antagonista interno. Prioriza a imagem da empresa e entra em conflito com Shelby e Miles.
- Jon Bernthal como Lee Iacocca: Executivo de marketing da Ford, visionário. Apoia Shelby e Miles, mas precisa navegar na política da empresa.
- Caitriona Balfe como Mollie Miles: Esposa de Ken, seu apoio fundamental em meio aos riscos e incertezas das corridas.
- Remo Girone como Enzo Ferrari: Fundador da Ferrari, rival lendário e imponente.
- Ray McKinnon como Phil Remington: Braço direito de Carroll Shelby. Engenheiro e chefe de equipe, leal e experiente.

Como termina o filme Ford vs. Ferrari: alerta spoilers!
No clímax do filme, a lendária corrida de 24 Horas de Le Mans de 1966 atinge seu ápice, com Ken Miles (interpretado por Christian Bale) liderando de forma dominante ao volante do Ford GT40, projetado e preparado pela equipe de Carroll Shelby (Matt Damon). A Ford, representada por seus executivos corporativos, particularmente Leo Beebe, interfere na corrida com uma decisão controversa: eles pedem a Shelby que ordene a Miles reduzir a velocidade para permitir que os outros dois carros da Ford, dirigidos por Bruce McLaren e Chris Amon, o alcancem, criando uma chegada orquestrada em formação para maximizar a publicidade da vitória da Ford contra a Ferrari.
Shelby, relutantemente, passa a instrução a Miles, que, apesar de sua frustração e do desejo de vencer plenamente com base em seu mérito, aceita a decisão por lealdade à equipe. A cena da chegada é tensa e visualmente impressionante, com os três carros da Ford cruzando a linha de chegada quase simultaneamente, aparentemente garantindo uma vitória esmagadora para a Ford e humilhando a Ferrari, que termina em segundo lugar com seu carro pilotado por Lorenzo Bandini e Jean Guichet.
No entanto, o desfecho da corrida reserva uma reviravolta amarga para Miles. Após a chegada, os oficiais da corrida declaram Bruce McLaren e Chris Amon como os vencedores oficiais, em vez de Miles, devido a uma tecnicalidade nas regras: como o carro de McLaren largou alguns metros atrás do de Miles na linha de largada, ele tecnicamente percorreu uma distância maior durante a corrida, mesmo que ambos tenham cruzado a linha de chegada juntos.
Leia também…
Brad Pitt estrela filme bilionário sobre Fórmula 1 produzido por Lewis Hamilton; veja preview
Essa decisão é devastadora para Miles, que, apesar de ter dominado a corrida e estabelecido um desempenho praticamente impecável, é privado da glória que merecia. Shelby, furioso com a manipulação corporativa e o resultado injusto, consola Miles, enquanto a Ford celebra a vitória como um triunfo institucional, ignorando o sacrifício pessoal e a genialidade de Miles. O filme destaca o contraste entre o espírito puro do automobilismo, representado por Miles e Shelby, e as maquinações cínicas do mundo corporativo, personificado pelos executivos da Ford, deixando um gosto agridoce no espectador.

Após a corrida, o filme avança para um epílogo trágico. Alguns meses depois, enquanto testava um novo modelo do Ford GT40, o J-Car, Ken Miles sofre um acidente fatal devido a uma falha mecânica, morrendo instantaneamente. A notícia devasta Shelby, que é mostrado refletindo sobre a perda de seu amigo e parceiro, carregando a culpa de não ter lutado mais contra as decisões corporativas que privaram Miles de sua vitória em Le Mans.
O filme termina com Shelby visitando a viúva de Miles, Mollie (Caitriona Balfe), e seu filho, Peter (Noah Jupe), em uma cena emocionante onde Shelby entrega a Peter uma chave de fenda que simboliza o legado de Miles como piloto e mecânico. Enquanto isso, a Ford é mostrada continuando a capitalizar a vitória de Le Mans, mas o foco do filme permanece no custo humano e no heroísmo de Miles, encerrando com uma homenagem ao seu talento e à sua paixão pelo automobilismo, deixando o público com uma mistura de admiração por suas conquistas e tristeza por sua morte prematura.
Leia mais…